“De restos e sobras também se faz carnaval”
INTRODUÇÃO:
Nossa escola vem mostrar neste carnaval que, dos aproximados 65 milhões de toneladas de lixo produzidos ao ano pelos brasileiros, há muitos restos e sobras que poderiam ser melhores aproveitados e não deveriam estar lá dando trabalho aos sorridentes garis, que todos os dias somem com esse monte de lixo despejados nas ruas.
Num sentido de tentar conscientizar sobre este fato, levaremos vários exemplos onde sobras e restos podem ser bem aproveitados, diminuindo a quantidade de lixo nas ruas e promovendo uma cultura sustentável.
Mostraremos sobras de carnavais que podem ser recicladas. Artistas de um lixo extraordinário; Restos luxuoso e criativo; Objetos obsoletos perdidos no tempo, mas ainda valorizados; Restos de esperança; Terminando com a consciência no descarte dos produtos reciclados.
Faremos com que esses “lix”, essas cinzas, esses restos e sobras que pareciam não mais ter utilidade sejam uma fênix renascendo das cinzas neste grande “Bal Masque”
SINOPSE:
“Tirem dos lixos
deste imenso país
restos de luxo”
(Joãozinho Trinta)
Lixo vem do latim “lix”, cinzas. O mesmo termo usado para designar a quarta-feira fatídica que decreta o fim do carnaval. Em um ano inteiro, acumula-se aproximadamente 65 milhões de toneladas de lixo no nosso país. Nos dia de reinado de Momo, cerca de 80 toneladas de lixo são deixados nas ruas, dando bastante trabalho para os garis que somem rapidamente com tanta sujeira. Mas o lixo, muitas vezes, não é o destino final de tantas sobras e restos.
“Frutos de uma imaginação”
No carnaval, por exemplo, a quarta-feira de cinzas sempre chega. Mas muitas fantasias e alegorias renascem, tal qual uma fênix, sendo importantes em outros momentos. Muitas escolas de sambas menos consagradas dependem das doações de fantasias e alegorias para dar frutos à imaginação e criar mais um carnaval. Panos, fitas, estandartes, que seriam restos e sobras, viram carnaval mais uma vez nas mãos de hábeis costureiras. Esculturas são repintadas, remontadas e reaproveitadas por criativos aderecistas, verdadeiros camaleões vencendo a falta de dinheiro e fazendo com que essas “cinzas” de um carnaval terminado, renasçam dignamente em outro lugar. É o luxo do lixo.
“Euforia que consome”
Outros artistas também têm se especializados em reaproveitar e consumir sobras e restos para desenvolver belissimamente sua arte. Um maestro paraguaio montou uma orquestra com violoncelos, violinos e violões de lata, formando a Orquestra de recicláveis de Cateu. O tropicalista Tom Zé também tira do lixo alguns sons, usando enceradeiras, buzinas e liquidificadores, criando seus “instruzémentos”. O artista plástico Vik Muniz causa, com seu lixo extraordinário, doses de euforia no mundo inteiro. Os compositores Arlindo Cruz e Zeca Pagodinho criaram um partido alto por conta das sobras de bagaços de laranja, eternizado na voz de Jovelina Pérola Negra. O carnavalesco Joãozinho Trinta criou, em 1989, um dos desfiles mais emblemáticos do sambódromo, fazendo uma ode ao lixo - Ratos e urubus larguem minha fantasia.
“Xepa, de lá pra cá xepei!”
A história do mais famoso prato brasileiro é cheia de folclore quanto aos tais restos jogados aos escravos. Conta-se a boca pequena que a realeza enchia o bucho com as partes nobres do porco e jogavam os restos aos escravos, que sabiamente misturaram com feijão preto e inventaram a feijoada. Seja lá qual for a verdade, a comida mais apreciada das quadras de escola de samba também foi criada através dos restos. Não há motivos de irem ao lixo: pé, orelha e rabo se podem ser consumidos e apreciados, seja por nobres, seja por escravos.
Hoje em dia, muitos alimentos também são desperdiçados por não sabermos o que fazer com eles. Mas, muitos chefes de cozinha estão “xepando”, especializando-se nesta alimentação sustentável e passando esse conhecimento para todos nós.
Muitas outras formas de se reaproveitar os alimentos já são hábitos que adquirimos de família. O tradicional “soborô” e o requintadíssimo “restod’onté” são iguarias fantásticas da cozinha brasileira. Chá com as cascas das frutas ou o delicioso bolinho de arroz, são outras opções para que reaproveitemos todos os alimentos, sem ter que sobrar no prato.
E mesmo se sobrar, a comida pode virar adubo com ajuda de minhocas pelo processo da compostagem.
“Reluziu...é ouro ou lata?”
Muitos objetos que já não prestam mais ou que já saíram de moda e que se tornaram obsoletos perante a sociedade, são restos ainda muito úteis para alguns.
Selos, cédulas e moedas antigas, todos fora de atividade, servem de relíquias para muitos colecionadores. Pratarias em geral, tão bem cuidadas que reluzem mais que peças novas. O LP e a vitrola, que um dia já foram restos pela descoberta de novas mídias, hoje são artigos de luxo por apreciadores da boa música. Muitos sebos preservam livros antigos, com folhas amareladas e encardidas, de uma escrita já ultrapassada, guardando parte da nossa história nesses alfarrábios.
Muitos desses objetos já ultrapassados têm um maior valor agora do que em suas épocas. Por isso, em muitas feiras de antiquários, como a do Rio Antigo, esses restos que já foram lata, são disputados a pesos de ouro.
“Sai do lixo a nobreza!”
Restos de esperança em gestos de plena nobreza. O projeto ação do coração é um exemplo, fazendo várias pessoas confeccionarem corações com restos de tecidos para serem doados para pessoas que nem se conhecem, enobrecendo o amor entre os seres humanos. Um cobertor que sobra em nossas casas pode ser o abrigo quente de alguém que precise dele. Pessoas cortam sobras de suas longas madeixas para que perucas sejam confeccionadas para pessoas no tratamento com câncer. Anéis de latinhas são juntados e reciclados para se fazer cadeiras de rodas com eles. Há também quem sente a necessidade de ajudar e faz com uma sobra de dinheiro que tem, aqueles restos de moedas jogadas no cofrinho. Ou principalmente, utiliza o tempo que te resta para dedica-lo a alguma causa nobre.
“Se ficar o rato pega, se cair urubu come”
E assim para o lixo virar luxo, para as cinzas renascerem como fênix, para os artistas se inspirarem, o lixo deve ser descartado da melhor forma possível. Mesmo quem não é um “artista do lixo”, pode cuidar disto de uma forma mais inteligente e sustentável. Assim, já estarão dando condições de que esses restos sejam encontrados de uma melhor forma por seus artistas.
Prestemos atenção ao descarte de eletrônicos. Separemos o lixo limpo, o lixo reciclável: plástico, vidro, metal e papelão. Informemo-nos sobre os postos de coletas para o melhor descarte deles.
Dos 65 milhões de toneladas de lixo descartados, mais de um terço são feitos de forma irregular, provocando alguns desastres naturais. Poderia ser muito pior se não existissem carroceiros buscando materiais recicláveis pelas ruas por míseros centavos por quilo. Uma questão de sobrevivência para eles, na luta com o dinheiro, fazem um favor a todos nós e aos seus amigos garis, colhendo o que é reciclado para que estes restos e sobras tenham seus destinos contemplados.
Façamos então os restos prestarem e as sobras se transformarem, diminuindo a quantidade de lixo nas ruas, formando uma corrente sustentável neste nosso planeta.
Até a quarta feira de cinzas chegar, que muitas sobras sejam reaproveitadas e muitos restos sejam reciclados. Que esses muitos exemplos sejam replicados e as atitudes sustentáveis se façam primordiais.
De sobras e restos, muitas coisas podem ser feitas, também carnaval. É o que a nossa escola vem mostrar.
Pronto pra se reciclar?
Primeira citação de Joãozinho Trinta - enredo “Ratos e Urubus, larguem minha fantasia”. As outras citações são referentes ao samba da Beija Flor de Nilópolis de 1989, de Betinho, Glyvaldo, Zé Maria e Osmar.
DESENVOLVIMENTO:
PRIMEIRO SETOR
Renascendo das cinzas de uma quarta-feira
Restos de um carnaval que são reutilizados em outros carnavais por outras escolas, poupando dinheiro e a quantidade de lixo, renascendo fantasias e alegorias das cinzas, ou melhor, da quarta-feira de cinzas.
Comissão de frente: Mágicos garis
Vestidos com ternos laranja de brilho e uma cartola também laranja, vêm fazendo levitações de lixos e desaparecendo de forma mágica com eles.
TRIPÉ 1: O caminhão de lixo
Ala 1: Pegue no lixo suas fantasias
“Mendigos, desocupados, pivetes, meretrizes, loucos, profetas, esfomeados e povo de rua.”
Ala 2: Reaproveitando as fantasias (ala coreografada)
Alas representando destaques e costureiras, que vão transformando a fantasia no meio do desfile.
Ala 3: Quem vai querer?
O leilão de fantasias. Alas mudando de cor conforme o tripé 2.
TRIPÉ 2: O Camaleão
Situado no meio da ala 3, um camaleão de led muda de cor constantemente, assim como as alas, conforme a bandeira que aparece no painel, também de led, na parte de baixo do tripé.
Ala 4: As cinzas da 4ª feira
Contrastando com as alas coloridas da frente, todos representando cinzas.
1º CARRO ALEGÓRICO:
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A fênix renascida
Uma grande fênix vermelha, feita de fuxicos e laços. Em suas garras, uma colcha de retalhos com o símbolo da nossa escola.
SEGUNDO SETOR
Artistas do lixo
Há muita criatividade em se utilizar de restos e sobras para se fazer arte. Lixos extraordinários criados por alguns gênios.
Ala 5: A orquestra de Cateu
Vestidos de maestros maltrapilhos com um estandarte com as notas musicais e diversos instrumentos. O maestro e sua baqueta no começo da ala.
Ala 6: “Instrunzémentos”
Enceradoras, buzinas e liquidificadores com a presença do cantor no começo da ala.
Ala 7: O lixo extraordinário – ala coreografada
Vários tipos de carcaças de lixo de ferro velho, formando a figura da apoteose. Vik Muniz no começo da ala.
Ala 8: O bagaço da laranja – Baianas
A laranja forma a saia das baianas. Em suas cabeças, a cumbuca da feijoada, vazia. Na frente da ala, Jovelina Pérola negra.
Ala 9: Ratos e urubus
Fantasia azul e branca com ratos nos ombros e urubu no chapéu da fantasia. Na frente da ala Joãozinho 30.
2º CARRO ALEGÓRICO
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O luxo do lixo
Escultura do Joãozinho 30, tal qual o Cristo do desfile original, coberto com sacos de lixo, apenas o rosto de Joãozinho 30 de fora, segurando uma faixa com o dizer: “Há luxo no lixo”. Na base do carro, fantasiados de mendigos fazem uma coreografia.
TERCEIRO SETOR
A maravilhosa cozinha das sobras e restos
Delícias perdidas entre restos e sobras de alimentos, desde a criação da feijoada até os “soborôs” feitos em casa, passando pela cozinha sustentável de vários chefs.
Ala 10: Os restos do porco: pé, orelha e rabo.
Fantasias do tamanho da pessoa, representando cada parte.
Ala 11: Feijão preto
O caldeirão de feijão.
Mestre sala e Porta Bandeira
O escravo e a nobre dama.
Ala 12: Bateria – A corte portuguesa
Fantasias criadas a partir dos quadros de Debret.
Ala 13: Passistas – Os escravos
Inspiração também nos quadros de Debret.
Ala 14: A xepa – Ala coreografada
Barracas de feira que são armadas e desarmadas, misturadas às frutas com ar de estragado.
Ala 15: O chá das cascas de fruta
O desfilante com a casca de fruta enrolada nele e um chapéu representando a fruta, e uma xícara em volta de seu corpo.
Ala 16: Soborô e restod’onté
A famosa quentinha do dia anterior guardada no tupperware
Ala 17: Ala das crianças – O bolinho de arroz
Fantasia de espuma, como se as crianças fossem os bolinhos.
3º CARRO ALEGÓRICO
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A cozinha sustentável do chef
Carro caracterizando uma cozinha, com panelas penduradas, fogão e diversos utensílios colocados em caixotes de feira, coreografado com pessoas fantasiadas de chefes de cozinha. Na parte de trás do carro, caixas representando a compostagem, com pessoas fantasiadas de minhoca, dentro desses grandes caixotes.
QUARTO SETOR
Os restos que resistiram ao tempo
Coisas que estariam no lixo, por terem se tornado obsoletos e antigos, tornam-se mais apreciados por terem um valor sentimental.
Ala 18: Selos
O selo olho de boi.
Ala 19: Moedas e cédulas antigas
Notas e moedas já fora de circulação.
Ala 20: Pratarias.
Bules e xícaras de prata.
TRIPÉ 3: A vitrola
Ala 21: LP
Vários LP´s em um estandarte.
Vários LP´s em um estandarte.
Ala 22: Livros de sebos
Fantasia representando uma estante cheia de livros nas costas do desfilante.
4º CARRO ALEGÓRICO
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Feira do Rio Antigo
Barracas e tapetes estendidos com objetos de antiguidade. Copos, xícaras, televisores antigos, vitrolas, porcelanas, tapetes e muitas outras bugigangas.
QUINTO SETOR
Ainda resta um pouco de esperança
A nobreza de um gesto, simbolizado pelas doações: das sobras de cabelos à sobras do tempo.
Ala 23: Ação do coração
Fantasia branca e corações de várias cores de tons vermelhos nas mãos dos desfilantes
Ala 24: Cobertor
Cobertos até a cabeça, cobertores de várias cores.
Ala 25: Cabelos do bem
Ala de drag queens. Batendo os cabelos.
Ala 26: Ala de cadeirantes – Anéis de latinhas
Fantasias quadriculadas em azul e vermelho, e um anel metalizado no chapéu.
Ala 27: Sobrou dinheiro?
O porquinho onde guardamos os restos de moedas.
Ala 28: Velha Guarda – Senhores do tempo
5º CARRO ALEGÓRICO
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O tempo que nos resta
Inspirado na obra de Salvador Dali – A persistência da memória. Pessoas fazendo coreografias da engrenagem de um relógio e fazendo o papel de ponteiros
SEXTO SETOR
O lixo consciente – faça sua parte
O descarte consciente é primordial para que sobras e restos se transformem
Ala 29: Lixo eletrônico
Pilhas e baterias
Ala 30: Plástico
Garrafa pet.
Ala 31: Vidros
Cacos de vidros formando um mosaico.
TRIPÉ 4: LIXEIRAS DO LIXO LIMPO
Ala 32: Metal
Latinhas de alumínio.
Ala 33: Papelão
Caixas.
6º CARRO ALEGÓRICO
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Os catadores
Carro em formato de escada, com várias carroças coloridas sobre ele fazendo coreografias.
Ala 34: Compositores – Porta vozes da sustentabilidade
FIM
AUTOR DO ENREDO:
Nome: Fabio Granville
Idade: 34 anos
Profissão: Professor
Ama o carnaval: desde 1993
Frequenta a Sapucaí: desde 1994
- Campeão do V Concurso de enredos
- Vice-campeão do VI concurso de enredos
- Vice-campeão do VI concurso de enredos
Mora em: Santos/SP
Um tema especial, dada a sua importância e atualidade, num enredo muito bem escrito e contextualizado, seja pela menção pertinente a alguns fatos, iniciativas e pessoas, tais como Joãozinho Trinta e sua atuação sustentável no Carnaval, e Vick Muniz, um artista plástico reconhecido mundialmente pelo seu trabalho de criação com lixo. Além disso, o corpo do texto, muito bem moldado formalmente, além das imagens que o reforçam, tanto em beleza, como em temática.
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